Deixo de existir quando escrevo um poema.
Torno-me obscura e vazia, porque tiro tudo de mim.
Deixo de existir quando a poesia me invade,
Porque nada em mim é mais absoluto do que a poesia.
A poesia ocupa um espaço que eu ocupava com minha vida
E faz com que eu desapareça.
Eu deixo de ser importante, porque a poesia é mais
importante do que eu.
Eu existo só para que ela exista e, por ela existir,
Minha existência está justificada.
(Quando li a “Canção do Exílio”, de Gonçalves Dias,
Pela primeira vez, eu soube que ele havia naufragado
Quando voltava, doente, para o Brasil,
E que morria de medo do oceano terrível,
Que o devoraria diante do litoral do seu Maranhão.
O que as águas foram para o poeta senão seu berço e
seu túmulo?)
Os poetas estão vivos em seus poemas, como vivem em
mim
Depois de mortos, suas vozes inesquecíveis em seus
versos
Alcançam-me como mil línguas de fogo, a falar através
dos oceanos,
De suas Troias e Atlântidas perdidas, por onde reboa o
canto das sereias,
As mesmas que embeveceram Ulisses e enlouqueceram os
náufragos.
O que são os poemas senão adagas de mil homens a
atravessar o deserto,
À procura do único oásis à beira do Nilo?
O que são os poemas senão as línguas que falam desde
Babel até aqui?
O poeta morre de melancolia, mas a dor se espalha pelo
poema,
E passa para nós seu antídoto imortal. Nunca
morreremos pela poesia.
O elixir da vida está no poema, que bebemos como
licor.
A beleza e a morte misturadas para sobrevivermos às
dores mortais.
Temos os poetas como arautos, antenas da raça,
menestréis de mil lugares,
Onde viveremos por mais mil anos, sobrevivendo à nossa
própria humanidade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário