sexta-feira, 12 de agosto de 2016

13 Atravesso para o outro lado da rua (TCRM)


Atravesso para o outro lado da rua
Onde tudo deixa de ser belo.
Daqui da minha janela, enxergo o mundo
Ao contrário de quem o vive.
Eu não vivo como eles.
Pela janela, o vizinho dá notícias de que vai bem.

Deste lado, continuo a arrumar os livros
Nas estantes, nas prateleiras mais altas,
Para criar distância entre mim e eles.

Os livros foram feitos para se hospedarem conosco.
Saem da prensa prontos para habitarem entre nós,
Nós, que nem reparamos quantos livros temos.

Minha casa tem muitos livros.
Alguns vivem comigo há cinquenta anos.
Outros, comprei outro dia.
Mas todos são colocados como relíquia nas prateleiras.

Às vezes, os livros se espremem entre outros
E querem sair para tomar um ar.
Isso me disse a dona de um sebo em São Paulo
No centro da cidade.

Levo meus livros para passear.
Dou meus livros (os que escrevo)
Ou compro novos quando entro na Travessa.
Ou não compro.
Eu deveria ser proibida de comprar mais livros.

E quando me canso de alguns deles,
Chamo o dono da Buriti e vendo tudo para ele.
Canso, não. Não quero mais.
Preciso de mais espaço para novos livros.

Um dia, os livros ocuparão menos lugar.
Mas isso talvez aconteça quando eu não tiver
Mais estantes.
Enquanto eu estiver por aqui,
Terei estantes cheias de livros.
Desses que escrevo e desses outros que compro por aí.

Livros (e o que está escrito dentro deles) são importantes
Pela importância que nos dão. Nós que nos importamos
Tão pouco com eles enquanto nos esperam nas estantes.

O livro e a poesia deveriam ser chamados de essenciais.


TCRM – 23/06/2016 – 20h11

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